Paulo Nogueira Batista Jr.
Volto à questão da “guerra cambial”. Desde que escrevi sobre o assunto nesta coluna há duas semanas, tivemos a reunião anual do FMI e do Banco Mundial, aqui em Washington. A “guerra cambial” foi intensamente discutida. Como seria de esperar, entretanto, não houve avanços em matéria de coordenação cambial ou soluções “globais”.
A questão será retomada na reunião ministerial do G-20, na Coreia do Sul, semana que vem, e na reunião de cúpula do G-20, em novembro. Parece fácil prever: haverá calor, mas pouca luz.
Os Estados Unidos continuarão praticando uma política monetária frouxa, que enfraquece o dólar. A China continuará resistindo a uma valorização substancial do yuan. Os demais países devem intensificar esforços para frear a subida de suas moedas. Formou-se um quadro de “não-apreciação competitiva”, como observou o economista americano Ted Truman.
Conseqüência prática: o Brasil precisa dedicar-se com urgência à definição e implementação, em nível nacional, de medidas para evitar que o país seja prejudicado por esses movimentos cambiais. O aumento do IOF de 2% para 4% nas aplicações de investidores estrangeiros em renda fixa foi uma medida correta, porém insuficiente.
Por que o pessimismo quanto à possibilidade de uma solução global? É que as tensões cambiais têm raiz na situação dos EUA e de outras economias avançadas. Essa situação não irá mudar tão cedo. O problema central é a debilidade da recuperação, o que resulta em níveis muito elevados de desemprego.
Nos EUA, a política fiscal não produziu os efeitos desejados em termos de reativação da demanda. Há espaço fiscal para introduzir novos estímulos, mas o governo Obama não parece ter condições políticas de seguir esse caminho. Em conseqüência, a responsabilidade de estimular a economia está recaindo sobre os ombros da Reserva Federal. A política monetária tem sido ultra-expansiva. E o banco central prepara uma nova rodada de “relaxamento quantitativo”, o que significa basicamente injeção de liquidez pela compra de títulos públicos.
Não se espera que a expansão monetária tenha grandes efeitos sobre a demanda doméstica nos EUA. Os consumidores estão endividados, desempregados, subempregados, ou com medo do desemprego. As empresas estão com nível elevado de capacidade ociosa e nível reduzido de confiança.
Nesse ambiente, a eficácia da política monetária depende sobretudo da depreciação cambial e seus efeitos sobre exportações e importações. A desvalorização do dólar permite que a economia americana ganhe competitividade internacional e cresça ocupando mercados no exterior ou substituindo importações por produção nacional.
Contudo, os demais países, a China à frente, não querem aceitar que as suas moedas se valorizem (ou seja, que o dólar se desvalorize). Pretendem preservar sua competitividade internacional e capacidade de exportar.
O Brasil já fez a sua parte. Permitiu uma expressiva apreciação do real e desequilibrou seu balanço de pagamentos em conta corrente.
Agora é preciso tomar providências para evitar que prossiga a valorização da moeda nacional. Isso inclui apertar a política fiscal para permitir uma queda dos juros internos, continuar acumulando reservas internacionais e adotar medidas de regulação dos fluxos de capital e de natureza prudencial na área financeira (inclusive no que diz respeito a derivativos).
Nelson Rodrigues dizia: “Em todo o casamento, há uma vítima; e há que se fazer todo o possível para não ser essa vítima”. Da mesma forma, pode-se dizer: em toda guerra cambial há vítimas; e há que se fazer todo o possível para não ser uma dessas vítimas.
Paulo Nogueira Batista Jr. é economista e diretor-executivo pelo Brasil e mais oito países no Fundo Monetário Internacional, mas expressa os seus pontos de vista em caráter pessoal.
E-mail: paulonbjr@hotmail.com
Twitter: @paulonbjr
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