segunda-feira, 13 de setembro de 2010

5 x Favela, agora por nós mesmos


Trechos do livro

“No contexto em que nos encontramos conversando, me sinto no direito de lembrar uma coisa: para ser bem-sucedido em qualquer forma de expressão artística, como no cinema, não bastam a sensibilidade, a intuição e o talento. É preciso ser do seu tempo. É preciso saber de onde viemos, para saber quem somos, para falar do presente, do passado e até do futuro, que é também um território da arte. É indispensável termos a consciência clara de que nunca estamos prontos, e que devemos estar sempre de olhos abertos, bem abertos, vendo, lendo, questionando, vivendo.”


Ruy Guerra em seu discurso de paraninfo das oficinas de 5 x favela, agora por nós mesmos.


“Hoje os jovens das favelas cariocas formam uma nova geração que, rompendo com os estereótipos de que é vítima, rompeu também com o conformismo que sempre relegou os moradores dessas comunidades a uma sombra de cidadãos, fantasmas sociais assombrando o sono dos ricos. Esses jovens estão agora construindo sua identidade, sobretudo através da cultura.”

Carlos Diegues no texto “Uma ponte sobre a cidade partida”.


Fonte de renda

“O filme nasceu de um roteiro coletivo, ou melhor, de um contexto coletivo.”

Manaíra Carneiro em seu texto “A jornada”.

“Meu objetivo era ter a capacidade de falar de igual para igual com “os grandes”, as pessoas que comandam outras pessoas. Entretanto, falar somente a língua deles não me basta mais, agora quero ter a capacidade de fazer com que essas pessoas compreendam a minha língua também, e é disso que trata o filme 5 x favela, agora por nós mesmos.”

Manaíra Carneiro em seu texto “Um encontro amistoso”.

“Passei pelos dois. Fiel logo me cumprimentou com um sorriso.

– E aê, rapá. Tranquilidade?

– Tranquilidade! – sorri.

Marcelinho me olhou com desdém.

– Coé, menor!

Fala sério, sou cinco anos mais velho que ele. Dei muito cascudo nesse mané. Agora o mané sou eu. Ele tem mais mulheres e mais dinheiro. Mas é claro que isso é só por um tempo, moleque ousado e ‘porra-louca’ não dura muito nessa vida. Engraçado, se deixo um cara desse sozinho em Madureira – que é aqui perto – é capaz de sentir uma dificuldade tremenda de voltar para casa. Só sai daqui para ir ao Shopping.”


Wagner Novais em seu texto “Tempestade de ideias”.

“A viagem foi cansativa. Chegamos ao Hotel Embassy, bem perto da Croisette. A correria era geral, tínhamos pouco mais de uma hora para comer e nos arrumar para o Marché du film. Não sabia o que ia fazer lá. O que tinha era um vestido de gala amarrotado e uma sandália muito alta que escorregava do meu pé. Precisava descansar meia hora apenas. Deitei na cama, mas minha cabeça não parava um segundo. ‘Como se diz ferro de passar em francês?’”


Manaíra Carneiro em seu texto “Ferrô de passé”.

“MAICON chega e se junta ao pessoal que está conversando. Chama discretamente EDU que vai até ele sem entender nada. MAICON mostra a trouxa de maconha para ele. EDU se empolga.”


Trecho do roteiro do filme Fonte de renda.

Arroz com Feijão

“João Moreira Salles, como quase todos os professores que passaram por esta oficina, repetiu que você nunca filma idêntico ao que roteirizou e nunca edita idêntico ao que filmou.”

“Essa coisa de roteiro Frankestein me remeteu ao proceso de criação dos nossos roteiros na CUFA, Nós do Morro, AfroReggae, Cinemaneiro e Observatório. Ali diversas contribuições formaram cada texto com o que tinha de melhor em cada uma das ideias. Quanto mais você divide a autoria, mais você é autor.”

“É interessante que toda a equipe saiba o que o diretor quer, o maquinista, o técnico de som, mas existem segredos que é melhor guardar. O Walter (Lima Jr.) faz uma pré-decupagem, que é divulgada para toda a equipe, e outra só para ele. De acordo com o clima do set, faz uma terceira decupagem na hora.”


Cacau Amaral em seu “Diário das oficinas”.

“… o cinema não deve ser 100% político nem 100% estético, mas algo entre esses dois extremos. Para uns diretores, mais ou menos isso. Para uns espectadores, mais ou menos aquilo. O importante é não parar de fazer filmes.”


Cacau Amaral em seu texto “Qual a função política do documentário?”

“Uma vez ouvi dizer que filmar crianças era igual a filmar com helicóptero na poeira. Você perde horas molhando o chão para alguns míseros segundos de filmagem, mas se não se dedicar completamente à ação de molhar o chão, na hora de filmar, a poeira vai subir e você se arrependerá por não ter perdido mais uma ou duas horas molhando. Com as crianças é a mesma coisa. Se você abrir mão de uma grande dedicação antes de filmar, depois se arrepende. E esse arrependimento não tem como ser mensurado, pois é muito subjetivo definir o que estamos perdendo quando deixamos de dar atenção a uma criança. Num set o bagulho é doido. Se você se deixa levar por essa doideira e por um instante esquece o verdadeiro foco, tudo está perdido.”


Cacau Amaral em seu “Diário das filmagens”.

Concerto para violino

“Li várias vezes o roteiro e tenho algumas observações: gostei, mas acho que está um pouco confuso, nós precisamos deixar a história mais clara e realista. Gostei muito dos diálogos, do tempo, do ritmo do filme e dos conflitos.

Eu acho que podemos melhorar mais o triângulo amoroso e a relação entre os três, o Rafael falou que não gosta muito de flashback, mas acho que a ideia e o roteiro pedem um flashback deles quando crianças.

Eu tive uma viagem e queria explicar pra vocês depois...

Tenho outras observações, mas vamos marcar um papo pessoalmente.

Segue o roteiro e algumas dúvidas nele em vermelho.”


Luciano Vidigal em seu e-mail “roteiro com observações” para Carlos Diegues e Rafael Dragaud.

“Não foi fácil criar estas histórias até o fim, mas eu segui o coração, experiência de vida, crença e realidade.”

Luciano Vidigal em seu e-mail “escaletas violino” para Carlos Diegues e Rafael Dragaud.

“Acho que esse filme é visceral mesmo, o mais visceral dos cinco. E é melodramático mesmo, se não tivermos clareza disso é melhor fazer outra história. Esse é o ‘larger than life’ dos cinco, e é bom que seja bem diferente dos outros.”


Carlos Diegues em seu e-mail “roteiro novo”, referindo-se ao filme Concerto para violino.

“De pé, diante da sua mesa da polícia militar, o TENENTE (45) grita furioso e bate na mesa olhando para Ademir, que está sentado, constrangido.

– Eu não quero saber! Essa porra não é bagunça não Ademir... Dá teu jeito, se vira porra! Se vira! Você acha que eu vou pagar essas armas que foram roubadas do quartel como? Com a merda do seu salário?”


Trecho do roteiro de Concerto para violino.

Deixa Voar

“No meu episódio, o Deixa voar, eu vejo o meu chão, cortado por linhas imaginárias que se tornam reais e físicas quando marcadas por siglas que mudam a cada dia, delimitando setores e impedindo não só imaginariamente, mas concretamente, o trânsito das pessoas.”

“As pessoas se reconheciam em um mundo difícil de ser reconhecido. No final, ver a mobilização das pessoas que ‘não eram’ da equipe e não trabalhavam no filme foi incrível, sentir que todos naquele momento eram 5X e estavam no mesmo barco me deixou supertranquilo pra me divertir e deixar voar.”


Cadu Barcelos em seu texto “A preparação”.

“FLÁVIO puxa toda a linha que consegue, ele dá passadas para trás. A linha puxada se amontoa no chão. FLÁVIO é surpreendido e avoa a pipa. RAFAEL sorri satisfeito. O PARDAL reage com raiva.

– Porra, minha pipa...”


“FLÁVIO, BUIU e MOLEQUE 1 chegam à fronteira, no mesmo lugar da cena 3. Eles param no mesmo lugar em que se despediram de CAROL. FLÁVIO toma coragem, olha em volta para ver se não há nenhum perigo à vista. FLÁVIO respira fundo e dá o primeiro passo para entrar na favela rival. BUIU e MOLEQUE 1 o seguem.”

Trechos do roteiro de Deixa voar.


Acende a Luz


“Fazia bastante tempo que não tinha a sensação de set. É como sexo. Você sempre pensa na última vez quando vai iniciar uma nova. Por isso é tão importante que todas sejam prazerosas. Pensava nestas coisas. Motivação, motivação, motivo e ação!”

“Minha última vez havia sido um pequeno set, porém muito arriscado, gravamos em um dia de eleição, uma votação para governador e deputados, com nossos personagens fazendo boca de urna para um candidato fictício: meu pai (sem cachê). O Pacífico, meu filho, era ainda um bebê de quatro meses. Com película, então, tivera até o momento apenas uma experiência de direção. O curta-metragem Mina de fé já fazia seis anos. Lembrei que depois da sua primeira exibição, no Odeon, escutei do próprio Cacá Diegues:

– Gostei muito do seu filme!

Foi como ter o filme abençoado.”

“Desci e entrei pela Rua Padre Ítalo Coelho, fui caminhando até a altura do número 48A, endereço para mim bastante conhecido. Casa da minha mae, minha casa durante grande parte da minha vida. E minha única herança. O barraco do 314.

Era o segundo dia de filmagem. Sim, já tínhamos cenas penduradas e deu um frio no estômago nas últimas cenas do dia anterior.”


“Havia na equipe do Vidigal muitos amigos. Alguns já companheiros de set, mais conhecidos como companheiros de furada. A Sheyla, um deles, havia mobilizado todo o 314 e estava dando certo. Filmaríamos a laje do Cimar (vizinho, amigo e ‘fazedor’ de pedras de gelo). É muito especial filmar o Cimar na sua própria laje. Aqui a realidade se misturava com a ficção. Isso confundia a cabeça de todos e eu amava!

Neste dia o Cacá chegou cedo e tive também a visita do Quito Ribeiro, nosso montador. Estávamos na laje. Uma só sequência durante toda a manhã, assim nao estávamos otimizando o tempo. Mas qual é esse limite? O limite de tentar acertar um plano, de fazer o plano perfeito?”


“Após o almoço recuperamos muita coisa, mas a luz caiu. Cai às três e meia nesta época do ano no Vidigal. Correria desesperada na tentativa de cumprir mais uma sequência até o final. Este dia deveria acabar mais cedo para descontar a hora que avançamos no dia anterior. Ficou claro para mim o que o Cacá dizia nas reuniões, que o desespero no set não leva a nada. Corremos, ensaiamos, mas o tempo, que não espera nem mesmo pelos justos, nos venceu. Desligaram as luzes!

Tentei pensar: as pessoas estão cansadas, a folga foi prometida e tem de ser dada. Foi frustrante demais!

Bom, como era de esperar com dois dias de ceninhas penduradas... Fui chamada à CPI do set. Graças a Santa Bárbara que perdeu sua cabeça para que eu não perca a minha!

Pensamos estratégias, eu fiz cortes no roteiro.

Ofereci cenas e planos aos deuses!”


“Fui ao cinema! Vale a pena de verdade toda a loucura, toda a entrega em um set de filmagem. Para depois... Sentar na sala, se aquecer e ver.”

Luciana Bezerra em suas “Notas do set”.



“Personagem Lopes: homem quieto, responsável. Cumpridor de seus deveres. É camarada. Está um pouco sozinho nesse Natal. No trabalho é muito respeitado, mas por alguns é considerado caxias. É bom de coração.”

Trechos da descrição dos personagens do filme Acende a luz.

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