segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

VÔO DA ÁGUIA


                                               
                                                                       Paulo Nogueira Batista Jr.

            Os últimos dados do PIB, divulgados há poucos dias pelo IBGE, confirmam que 2010 será um ano excepcional. A economia brasileira deve crescer entre 7,5% e 8% - ritmo que não se via desde 1986, época do Plano Cruzado.
            Poucos países se recuperaram tão rapidamente da crise internacional e poucos cresceram tanto em 2010. Entre os países do G-20, só China, Índia e talvez Argentina devem apresentar taxas de crescimento mais altas do que o Brasil.
            Com um crescimento tão robusto, o mercado de trabalho melhorou muito no país. A taxa média de desemprego caiu para 6% nas principais regiões metropolitanas, o nível mais baixo desde o início da série da pesquisa iniciada em 2002. Aumentou a proporção de empregados com carteira assinada. O nível de emprego formal vem crescendo ano a ano, de forma significativa. Nos doze meses acumulados até outubro, o emprego formal cresceu 5,5%.
            Nada mal para uma economia que parecia, há não muito tempo, condenada a um quadro de crescimento medíocre, incapaz de gerar empregos em quantidade e qualidade adequadas. Na década de 1990 e na primeira metade da atual, toda recuperação durava pouco. Era a síndrome do “vôo da galinha”.
            A expressão, muito difundida na imprensa, era profundamente humilhante. Comparado “urbi et orbi” a uma galinha, o brasileiro rilhava os dentes de frustração.
            Passou. Hoje, já podemos talvez arriscar: o vôo é de águia. Os estrangeiros, que não sofrem das nossas cautelas e inibições, tratam o Brasil de águia para cima. Aqui fora, a economia brasileira é um grande sucesso de público e bilheteria.     
            Mas, não vamos exagerar. A preocupação dominante no Brasil é a oposta. “Estamos crescendo demais”, sustentam alguns. “Isso terminará em lágrimas”, vaticinam outros. O Plano Cruzado, referido no primeiro parágrafo, é uma lembrança traumática – um exemplo de como o crescimento excessivo pode desaguar em inflação e desequilíbrios de balanço de pagamentos.
            Acredito, entretanto, que o Brasil aprendeu muito com o Cruzado e outros episódios. Ao longo de 2010, o governo tomou medidas para frear a demanda. Retirou estímulos introduzidos durante a crise e aumentou a taxa básica de juros. Agora em dezembro, O Banco Central decidiu aumentar os compulsórios bancários com a finalidade de conter a expansão do crédito. O novo governo anunciou também que fará cortes de gastos em todos os ministérios.
            As medidas de contenção anteriores já estão afetando o crescimento. O PIB do terceiro trimestre sofreu desaceleração apreciável. A indústria e a agropecuária apresentaram queda no trimestre em comparação com o trimestre anterior. Nos meses recentes, o grau de utilização da capacidade instalada na indústria tem ficado aproximadamente estável, com ligeira tendência de queda.  
            A desaceleração não chega a ser preocupante por enquanto. O ritmo do primeiro semestre (cerca de 8,5%) era provavelmente perigoso. Já estava tendo algum efeito sobre a inflação e as contas externas correntes.
            O desafio, como sempre, é equilibrar o crescimento com o controle da inflação e das contas externas. Esse é a primeira tarefa do novo governo em 2011. Manter a inflação e as contas externas em ordem, sim. Mas sem abortar o crescimento de que o país tanto precisa para continuar gerando empregos, reduzir a pobreza e superar o subdesenvolvimento. 
           
Publicado em “O Globo”, 11 de dezembro de 2010.

Paulo Nogueira Batista Jr. é economista e diretor-executivo pelo Brasil e mais oito países no Fundo Monetário Internacional, mas expressa os seus pontos de vista em caráter pessoal.

Twitter: @paulonbjr   

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