Brasil e EUA
Paulo Nogueira Batista Jr.
As relações entre os EUA e o Brasil têm sido objeto de muitos comentários duvidosos na imprensa brasileira no passado recente. A visita do presidente Obama, entre outras aspectos positivos, ajudará, acredito, a desmistificar um pouco o tema.
Foi reveladora, por exemplo, a declaração de Mike Froman, vice-conselheiro de segurança nacional da Casa Branca: “Essa viagem é fundamentalmente a respeito da recuperação econômica americana e de exportações americanas. As exportações para o Brasil geram 250 mil empregos nos EUA; metade da população do Brasil é hoje considerada classe média e isso cria uma grande oportunidade para vendermos nossos produtos lá”.
De fato, o Brasil vem dando importante contribuição à recuperação dos EUA. O nosso déficit comercial com os EUA aumentou de US$ 4,5 bilhões em 2009 para US$ 7,8 bilhões em 2010, segundo dados do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
A julgar pelas declarações de Froman, os EUA querem que o Brasil contribua ainda mais. A pergunta óbvia é: qual a contrapartida? O que os americanos estão botando na mesa? Maior acesso ao mercado americano? Redução das inúmeras barreiras às exportações brasileiras que existem nos EUA?
Espero que esteja enganado, mas é provável que os EUA tenham, atualmente, muito a pedir e pouco a oferecer. A situação econômica deles continua frágil, o desemprego muito elevado e eles precisam, desesperadamente, exportar mais para o resto do mundo. Os americanos querem sair da crise ampliando a sua presença em mercados promissores como o do Brasil.
Do lado brasileiro, como se sabe, um dos problemas é que o nosso déficit externo total aumentou rapidamente e já alcança níveis preocupantes. Não parece razoável que o Brasil amplie ainda mais o seu desequilíbrio bilateral com os EUA. Precisaríamos, ao contrário, diminuí-lo.
Seja como for, as relações Brasil-EUA não se limitam a temas bilaterais. São cada vez mais importantes as questões de ordem mundial (Nações Unidas, G-20, FMI, Banco Mundial, clima, etc.).
Nesse terreno, também não está muito claro o que os EUA têm a oferecer. Por exemplo: parece haver alguma dificuldade de apoiar efetivamente a entrada do Brasil no Conselho de Segurança da ONU. Quando da visita que o presidente Obama fez recentemente à Índia, repercutiu muito a sua declaração de apoio à entrada desse país no Conselho de Segurança. Comparações serão inevitáveis.
Permita-me, leitor, falar um pouco da minha experiência com os americanos no FMI e no G-20. Primeiro, temos tido muitas divergências com eles em diversas questões. É natural. Diferentemente, de muitos países em desenvolvimento e até de alguns desenvolvidos, o Brasil não se alinha automaticamente com os EUA ou qualquer outro país. Atuamos de forma independente, e isso às vezes incomoda grandes potências como os EUA.
Por outro lado, temos também muitas áreas de convergência e pontos de interesse comum com os americanos. Temos atuado em conjunto em diversos temas. A dificuldade é que, mesmo quando há convergência com os EUA no G-20 e no FMI, nem sempre é fácil trabalhar com eles. Eles gostam de fazer tudo sozinhos, sem grandes consultas a outros países.
Atuam, não raro, de forma unilateral. E nem sempre escolhem os melhores caminhos para alcançar objetivos comuns. Essa é uma mensagem que eles têm dificuldade de absorver: o Brasil espera ser consultado e ouvido antes de qualquer iniciativa importante. Parceria, sim. Mas com diálogo, e não para apoiar fatos consumados. A relação só será produtiva se for de igual para igual.
Paulo Nogueira Batista Jr. é economista e diretor-executivo pelo Brasil e mais oito países no Fundo Monetário Internacional, mas expressa os seus pontos de vista em caráter pessoal.
E-mail: paulonbjr@hotmail.com
Twitter: @paulonbjr
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